domingo, fevereiro 27, 2011

I'll Try Anything Once

Picture from Hello From Lisbon

Cheguei a casa e senti uma corrente de ar diferente.
Aproximei-me do meu quarto e a janela estava aberta.
O sol rasgava as paredes brancas e todo aquele espaço poderia fazer parte de um cenário realista qualquer a la Coppola.

Chego à janela e subi ao telhado.
A Lisboa com aquela luz incrível e o calor da chegada da Primavera serviam de baloiço a Matthew que estava estaticamente sentado sobre a água-furtada.

"Posso?" Perguntei eu já no telhado.
"Sim." Respondeu ele sem abrir os olhos.

Deitei-me ali a seu lado e aguardei que ele me contasse no momento que achasse que conseguiria.

"Dormi lá. Mas não aconteceu nada. E não consigo deixar de sentir que aconteceu tudo.
Falámos da vida nestes últimos anos desde que voltei. Falámos de amor. Do nosso amor.
Durante o sono os nossos corpos tomaram o controlo das nossas vidas. Lutámos para que nada de concreto acontecesse. Acordei com os primeiros raios de sol com a força do sexo que gemia entre os nossos poros. Senti-me em casa. Como se os anos não tivessem passado e ainda vivesse-mos juntos. Ainda fossemos quem éramos Fingi que nem me passou pela cabeça tomar banho a dois. Fingi que tudo aquilo tinha sido apenas reflexo de uma possível carência afectiva projectada numa pessoa que estava ali. Fingimos que não nos queríamos beijar. Fingi que aquela tosta não me recordou o sabor dos pequenos-almoços dos outros tempos. Segurei-me ao ser adulto e não consigo pensar noutra coisa senão em nós."

Sentei-me e perguntei: "Queres falar sobre isso? Não tem mal se vocês forem efectivamente os..."

Olhou-me nos olhos agora abertos e sorriu. Num tom baixinho disse apenas:
"Não. Vamos voltar a fechar os olhos e continuar a sonhar acordados com tudo isto aqui, pode ser?"


"Sim." Respondi eu e deitei-me novamente a seu lado.



Muzicons.com

***
"when i said ' I can see me in your eyes', you said 'I can see you in my bed', that's not just friendship that's romance too, you like music we can dance to, Sit me down, Shut me up, i'll calm down, and i'll get along with you,"
***
The Strokes

quarta-feira, fevereiro 23, 2011

Sometimes


"Às segundas começo a semana cheio de força. Tudo parece pronto a aceitar as minhas alterações.
Às terças sinto a tua falta.
Às quartas sinto que estou a meio da semana e percebo que não vou conseguir cumprir tudo o que agendei mentalmente para tão poucas horas por dia.
Às quintas sinto a tua falta.
Às sextas acho que o mundo pode desabar mas eu quero é dançar.
Aos sábados gosto de aproveitar as maravilhas de, mais uma vez, viver no coração de uma cidade da Europa e poder saborear tudo o que isso tem de mais surpreendente.
Aos domingos sinto a tua falta.
"

in POSH, Las Divinas Palabras

domingo, fevereiro 20, 2011

"Eu quero que você venha comigo (...)"


Acordou e deixou-se ficar nos lençóis quentes a admirar aquele sol que entrava pela janela e compunha sombras e formas inigualáveis naquele quarto.
Em câmara lenta sente os cantos dos seus lábios a elevarem-se transbordando um sorriso especial em si.
Deixa-se ficar... No silêncio daquela revisão da noite anterior.

Tenho saudades disto - disse ele ao olhar para um quadro no Braço de Prata.
Sorrindo entre o barulho de quem espera por uma bebida no bar ela sorri e busca-o com o olhar.
- Hum hum,.. Também eu. Disto.
Sorriu de volta e sente o calor que só ela se consegue transmitir. O entendimento perfeito e a telepatia intacta de um amor incondicional.
- Tenho mesmo... - De arte. - Sim. - Mas não é das outras coisas. É da arte. - Sim.

A bebida chega e ele continua a contemplar aquele quadro que estava na parede como tantas outras coisas. Não que o quadro fosse genial mas tinha sido o suficiente para o reportar à vida que teve e lhe faz falta.
Deixou-se ficar ali em silêncio com ela enquanto os restantes amigos aguardavam as suas bebidas e falavam de outras coisas.
- Sabes, ainda no outro dia disse uma daquelas coisas que te sai tão naturalmente que te obriga a confrontar a veracidade da espontaneidade em si. Do nada, ou num momento como este em que me lembro daquela época, olhei à volta e disse à Marta que sentia que no último ano me sentia mais bruto. De alguma forma aquilo ali "embruteceu-me". Ela, num segundo compreensivo passou para outro em que naturalmente, por suspeita e perspicácia, me questionou o porquê na certeza de acertar naquilo em que eu pensava.
Desviei o assunto porque não queria que ela me interpretasse de forma errada como incluída num bolo em que não a incluiu. Mas a verdade é que existe um facto com que acordei naquele dia. Precisava de me "afastar" mais um pouco de todo aquele universo e retomar o meu.
- Pois eu percebo-te. Mas talvez seja também porque agora tens menos tempo.
- A falta de tempo nunca foi desculpa naquele tempo, por isso não deveria ser agora.


Levantou-se e dirigiu-se à janela para ver o dia.
Estava ali a sentir o sol na cara quando o vizinho do prédio em frente liga a aparelhagem.
Caetano Veloso e Chico Buarque cantavam "Você não entende nada"
Tãoooo bom. Melhor era impossível. Acordar com a memória daquela conversa e sentir a confirmação da vida em si mesma com aquela música que era uma de muitas que serviam de banda sonora aqueles tempos.
Tãooo bom. Ficou ali, deixou-se ficar a aguardar a parte que sabia que adorava em que entre "Todo dia" do Caetano passamos para "Todo o dia ela faz tudo sempre igual" do Chico.
Tãooo bommm.

Viajou na vida e pela vida e o tempo perdeu qualquer valor no espaço ali.