segunda-feira, dezembro 29, 2008

The Mad Tea Party at Alice´s Wonderland

27 de Dezembro de 2008
My Birthday Party BITCH!
frame photo by Eric Van Den Brulle

Um desaparecimento repentino; milhas de distância da cidade; um local secreto; um jardim nocturno misterioso; cartas espalhadas por uma casa em miniatura onde os cantos e recantos revelavam os detalhes mais bucólicos; velas; pratos mágicos e copos voadores; fantasias detalhadas e 50mil disparates; caminhadas às escuras no meio da selva onde o menor barulho fizeram 5 personagens correr; liberdade; surpresa; 25 anos; tudo!

Thank you all!!!
It was FABULOUS DARLINGS!!!!!

Love you

segunda-feira, dezembro 22, 2008

Se dormirmos na neve, não sentimos a morte a chegar.



"Ouve...há momentos,em que a vida exige mudancas.Transições,como as estações.A nossa primavera foi maravilhosa. Mas, agora o Verão acabou. Perdemos o nosso Outono e de repente está tao frio que tudo começa a congelar. O nosso amor hibernou e a neve surpreendeu-nos. Se dormirmos na neve, nao sentimos a morte chegar. Cuida-te."

Faubourg Saint-Denis by Tom Tykwer
in Paris Je t'aime

domingo, dezembro 21, 2008

YULE // Solstício de Inverno

E hoje acordei assim... com um MMS de uma pessoal simplesmente genial que decidiu ver o sol nascer, fotografar, e partilha-lo comigo.

photo by Helio Pires

E é assim que reconheço a perfeição da vida em nós. A imensa pontaria que tem com os ponteiros do relógios, as rotações da terra, e os acontecimentos das nossas próprias vidas. A forma genial com que nos rebenta um sorriso pela ironia e constactação da perfeição em tudo, numa vida, em nós.

E para os que não sabem do que se trata aqui fica (fui vasculhar nos livros do tempo em que estudava religiões - quem diria):

YULE - Solstício de Inverno
21 de Dezembro
O dia mais curto do ano, a noite mais longa do ano.
Os tempos sombrios entre Samhain e Yule chegam ao fim quando os dias começam de novo a crescer. É um sabbat próprio para a reflexão sobre a forma como todas as coisas se inter-relacionam, para fundir as memórias e para celebrar o regresso da luz, que em breve irá de novo fertilizar e aquecer a terra. É o dia em que se festeja o Sol, o trovão e as deidades de fogo.

Thanks dear Helio ;)

When enough is enough... let it die far away, and try never forget any detail!


Um fato escuro discreto; uma garrafa de vinho vazia; um duplo homicídio; sangue nas teclas de um piano; uma máscara branca sobre os corpos; um segredo revelado; um bilhete de avião; um concerto surpresa; uma multidão coreografada; o pulsar de um coração reanimado; os cabelos contra o vento num carro sem tecto; o terreiro do paço e o tejo; o frio de uma joia escondida contra o peito, numa noite de inverno que celebra o solstício (Yule); o abandono de uma história; um perfume antigo; e uma frase que, nos lábios certos, redefinem toda uma vida.

Os ingredientes perfeitos de um crime, os detalhes necessários para uma história inacreditável mas real. O sabor perfeito de uma boa vida e o sorriso que nos traz a serenidade do fim.

Estava eu a sair quando ele me agarra no braço, e com a face descontrolada me pergunta:
- E nós?... quer dizer, vais-te embora assim sem te poder explicar?... É que eu acho que percebeste mal e ... e nós?...e eu?Vais mesmo embora?
- Chega! - e com um sorriso sereno de profunda imagem de liberdade e pena por aquela criatura - When enough is enough... let it die far away, and try never forget any detail! Tem uma boa vida, se algum dia o conseguires.

;)

sexta-feira, dezembro 19, 2008

All I wanna do…

E o dia fabuloso que esteve hoje??? Hum?hum? ninguém reparou?
Hoje acordei inspirado!

photo by MASSIVE
Depois de um dia em que as verdades mais crueis acabaram com o que restava de crença humana em mim, onde os filmes mais rebuscados e as músicas mais suspirantes reinavam de comparação, hoje acordei virado ao contrário.

E no verso reconheci uma identidade que tinha desaparecido à muito. Acordo com o despertador da minha “esposa” e voltei a adormecer. No sonho entremédio dei comigo de regresso, novamente, à terra de onde julguei ter sido um erro partir. Horas mais tarde desço as escadas e o imenso sol que se fazia reflectir em todos os poros da casa despertaram-me em breves segundos.

Lembrei-me de tudo, recuperei a memória, e nela fantasiei um grande baile de fim de verão com todas as personagens de que me despedia.

A vida sabe-me tão bem agora que o frio que me gela a cara me recorda de tudo.
Surgiu-me uma música rapidamente à cabeça. Não pela letra (e talvez também, porque todos queremos, em parte o mesmo) mas sobretudo pela batida inspiradora.

Liguei a aparelhagem e deixei que ela inundasse a casa!
A campainha toca e era o correio com uma encomenda… Os famosos e tão saborosos bolinhos de Natal com que o Hélio me brinda todos os anos.

Ai a vida é tão outra coisa, é tão mais isto.
O dia continuo extraordinário e hoje vou comemorar com a “sist” e abanar os ossos para que cara poro recupere o ar que em tempos perdeu.

All I wanna do is LIVE!!!
Tenham um excelente dia, tenham uma excelente noite, e sobretudo, tenham uma excelente vida!

Astounded - Bran Van 3000

quinta-feira, dezembro 11, 2008

Time has come



"Time to stand up,
time to grow up,
time to let go,
...time."

Contar um sonho é proibido.

photo by Ed Viggiani

"Quem contar um sonho que sonhou, não conta tudo o que encontrou…"

A vida dá voltas… ah se dá.

Estou aqui sentado a aguardar em silêncio. Esta sala de conforto tornou-se quente. Já não me lembrava como era à algum tempo…
Olho em redor e reparo nas caras dos estranhos. Uns estão acompanhados, outros, como eu, aguardam sozinhos.
O Inverno lá fora arrasta nos vidros alguma nostalgia.

O meu telefone toca e oiço a Isabelle, com insónias, a beber o seu vinho à janela, e eu nem lhe digo onde estou.
“Estou na minha casa nova. Daqui vejo a torre Eiffel.
Agora sempre que acordar vou-me lembrar que é isto… o sonho.”
- diz ela com a voz arrastada.

A vida dá voltas… ah se dá.

A Laura chega amanhã de Africa do Sul depois de quase 20 anos sem voltar a pisar aquela terra;
A Mrs.Dalloway recolhe-se em casa mantendo o silêncio da sua vontade. Ou a serenidade de quem sabe aguardar pelo momento certo sem que os “dias de entretanto” lhe pareçam pesados;
O Jonh exilou-se em terras distantes onde cozinha a sua procura pelo amor. Desespera e sente-se perdido naquele imenso hotel onde às vezes teme ter perdido o rumo;
A Leonor recosta o corpo no seu já “velho companheiro” e alivia o medo da possibilidade de ter que abandonar Amesterdão;
O Robert, em Londres, prepara-se para mais uma noite de recompensa com o seu novo amante e esquecimento do seu elouquecido noivado;
Também em Londres, o meu querido Lord Henry prepara-se para o embarque desta época em que recebe os abraços de tantos amigos que por cá deixou;
A Sofia divorciou-se;
O Miguel perdeu-se e deixou-se anestesiar na vertigem do demente Mr.Butterfly;
O Mr.Butterfly , depois de se relevar um simples insecto com asas, arrepia-se nos seus lençois enquanto tenta perceber o que fez à própria vida;
O Blue sente saudades dos tempos em que a subtileza das palavras criavam histórias e enredos em seu redor na procura da beleza e degustação da vida tangível;
O Sisley tenta refazer a sua vida a acreditar no amor com este novo rumo a que se entregou;
A Mariana prepara-se para finalmente viver a adrenalina do maior salto que dará sobre si. A vida é tão irónica que até ao ser mais perfeito obriga a trair para que possa ser recompensado de alguma forma;
A Sara adormece sozinha tentando não prestar atenção ao já longo atraso do seu marido;
A Piaf persente que não tarda chegará a hora de partir;
A Joana continua convencida que tudo se irá resolver e que num estalar de dedos voltará a ser o que era;
A Lúcia tenta adormecer a febre de ter regressado ao campo;
A Rita sucumbe aos poucos na imensa solidão a que se condenou pelos seus actos;
A Andreia reune forças para acreditar que chegou a hora de ser felíz;
O Willy adormece-se em mais uma linha de coca na esperança que um dia alguém o leve;
O Le Petit Prince tenta saborear todo o amor que a sua imensa vida consegue gerar;
O Matthew adormece cheio de medo de nunca vir a ter coragem de resgatar a Isabelle;
A Isabelle tenta adormecer no cansaço de tanto pensar nas voltas que a vida dá;

E eu estou aqui, sentado, no aeroporto, também eu a pensar nas voltas que a vida dá… ah se dá.

"Quem contar um sonho que sonhou, não conta tudo o que encontrou.
Contar um sonho é proibido.
"

quarta-feira, dezembro 10, 2008

Tonight

A ti, dear Isabelle...




Lykke Li // Tonight


"watch my back so i'll make sure
you're right behind me as before
yesterday the night before tomorrow"


quinta-feira, dezembro 04, 2008

Dangerous Liaisons

photo by Pete Turner

Dias depois da festa, Theo é convidado para um jantar em que a importância da sua presença trespassava a função publicitária do que iria ou deveria vestir.
Naquela manhã acordara com uma sensação estranha mas que desvalorizou dado o desconto que se habituou a dar à sua criatividade espontânea.
Foi fazer umas compras pela Av.da Liberdade e lanchar com uma velha amiga.
Algures entre a sua fatia de pecado de chocolate ela prepara-o.

- Sabes que nesse jantar vão lá estar pessoas que não queres ver, não sabes?
- Sei, mas já é tempo de gerir estas coisas. A Laura pediu-me por tudo para estar presente. Ela precisa do meu apoio para subir as vendas e para a apoiar durante o jantar.
- Sim, eu percebo… eu disse-lhe que não podia ir porque tenho um voo hoje às 22h para Barcelona.
- Sempre vais hoje? Tinha percebido que irias só amanhã.
- E ía… mas para nem estar por perto esta noite decidi antecipar a viagem.
- Eu percebo. Mas não te preocupes, eu vou comportar-me como um senhor e guardarei toda e qualquer informação que te venha a ser útil.
- Eu sei meu querido, nem espero menos de ti.


Anoiteceu e ele já aparece no jantar prontíssimo para cumprir a sua função.
Estavam lá o agradáveis e os desagradáveis corpos do costume. A noite correu como esperada e já quando se preparava para abandonar a tão transformada estação do Rossio, olhou em redor e pensou num tom irónico: “Sobrevivi a isto, já nada me mata.”

Entra no carro e indica a próxima paragem.
A caminho de casa apercebe-se que afinal ainda lhe apetecia dançar. Muda a rota e liga à Leonor (a sempre em festa Leonor).
- Onde estão?
- A caminho do “Inferno”, vens ter conosco?
- Sim, apatece-me dançar e libertar as más energias de um jantar onde estive até agora.
- Foste ao jantar da Laura? Ela também me ligou mas eu nem lhe menti. Disse-lhe logo que me pedisse tudo menos isso. Mas vem cá ter, nós já estamos mesmo a entrar.


Ao inverter o sentido do seu rumo percebe que há um acidente na marginal.
- Se calhar vamos por dentro Manuel. Coitados… não consigo assistir a nada disto hoje.
- Sim, vamos por Alcântara.

Ao passar pela inevitável rua não consegue evitar olhar para a porta que revela o carro de outros tempos, como sempre, mal estacionado.
O seu corpo sente um estranho frio e o sorriso acaba por ser substituido por uma expressão nova.
Manuel, sempre atento pelo retrovisor, abranda prepositadamente a velocidade. Estavam quase parados naquela marcha subitamente lenta em frente à porta.
Theo nem tentou impedir. Pois as sombras que via descer pelas escadas já teriam sido antecipadas por aquele velho companheiro.

Dois vultos tomaram forma mas a pior de todas. Sim, era o corpo antigo com um outro que Theo nem queria acreditar.
O estranho e misterioso corpo que desaparecera da sua vida à mais de um mês estava ali mesmo à sua frente.

O carro fica imóvel. Os vidros fechados mesmo assim não conseguiam isolar o grito na face de Theo. Estavam ali os dois, juntos… os dois.
Como é que era possível que, em momentos menos sóbrios, ele tenha previsto aquela cena e rapidamente a recalcara pelo medo de ser injusto. Era a nova hipótese que explicava o desaprecimento e a total evasão. A pior de todas e a, ali mesmo à sua frente, a mais real.

O passado e o presente juntos na maior cumplicidade como se de dois ladrões de vida se tratassem. A cobardia e a mentira, a traição e febre nojenta da ambição tinham-se apoderado do momento e inundado aquelas duas faces que não acreditava ver através do vidro. A morte. O silêncio. A fuga.

- Manuel, vamos embora por favor.

O carro arranca a uma velocidade indiscreta e os vultos olham.
Não soube se for a visto, nem quer saber.
Abandonou o local do crime, ligou à Leonor para cancelar a noite e regressou ao Petit Trianon.
Quanto terá valido aquela traição? É a questão que carrega para o momento em que, entre as muralhas da cidade, vir confirmada e verbalizada a cena a que assitira.

La vie en ROUGE II

Era ele, Matthew. A olhar para mim, nas escadas do Hotel, com toda a certeza de quem me esperava por aquele momento.
photo by Ed Freeman

Desço os degraus pisando o chão de uma forma firme depois do compasso em que respirei fundo ao topo.
Aproximo-mo dele e pergunto:

- Estavas à minha espera caro Matthew?
- Não sejas hipócrita, sabes bem que não estaria em frente ao Lapa Palace se não estivesse à tua espera… ou à dela.
- Se estavas à espera dos dois já vens tarde, ela partiu cedo. Talvez devesses ter vindo à festa, não?… ah, que disparate, já me esquecia que nunca terias tomates pra vir, não é?
- Estúpido, eu não vim porque não quis.
- Ai sim?Então o que estás a fazer aqui agora?… Contavas encontra-la e não esperavas ver-me a mim, confessa.
Tu acreditas no amor eterno, não sejas cobarde e assume-o
- Eu sou um romântico. Acredito em amar tudo e todos, e como sou parvo, apaixono-me por tudo. Conclusão: a paixao lixa-me o amor.
- Ahhhhh meu caro gémeo sonhador.... que saudades. Concordo e também acho que exista.
Tu já o tens nas mãos mas andas com ele sem nunca o largar por inteiro.
Seremos sempre isto, mas tu serás sempre a esperança.
O do corpo incorrumpível que só deixa que lhe contaminem os lábios e a pele, mas o sangue, esse será sempre só o teu, o puro, o genuino, o que ainda acredita!
Isso é extraordinário, invejável até .
- Olha lá, tu tens noção que acabaste de me despir como nunca ninguém o fez?
Sinto-me completamente nu. Odeio-te. Cabrão.
- Tu tens noção que sempre estivemos a nu um com o outro, não tens?
- Juro-te, sinto-me pela priemira vez a descoberto. Que horrorrrrrrr…Acho que nunca me despiram tao rápido. Como és capaz? Odeio-te…
- É… a velocidade é um dos meus fortes, ou um dos meus males, nunca cheguei a perceber.
- Como se fosses contaminado na concha percebes? Uma ostra num mar sujo vive suja, mas há sempre uma esperança lá dentro. Ai… está a fazer-me confusão falar de mim. É demasiado pessoal e não o falo com ninguém. Nunca o fiz e isto baralha-me.


O silêncio apodera-se do momento e Matthew, nervoso, afasta-se até ao jardim. Parecia completamente perdido. Aproximo-me dele e ergo o meu braço sobre os seus ombros.

- É mais fácil calarmo-nos do que falarmos de nós mesmos, não é? Mas não temas... doi mas liberta.
- Ás vezes prefiro surpreender-me com as minhas acções do que pensar porque as fiz.
- Ás vezes preferes agir sem pensar na ilusão de isso te ilibar da responsabilidade dos teus actos, isso sim. Preferes não dar tempo à tua consciência na esperança de que a grande máquina por ti arquitectada apague rapidamente o peso do resultado dos teus próprios pensamentos. Era isto que querias quando me convidaste ontem a ficar à conversa à lareira... a certeza que não elouqueceste quando chegaste a estas conclusões sozinho e a sós. A confirmação de alguém que não tem nada a perder e por isso te verbaliza, em corpo presente, o que vês gritar de dentro de ti.
- Se eu soubesse que iamos ter esta conversa à lareira nunca te convidaria.
- Convidarias sim... Quanto mais não fosse pela vaidade de correr esse mesmo risco e da quase tesão mórbida de testar o limite da tua pele.

Afasta-se e de costas reage…

- Cala-te
- Calma meu amigo, eu não seria o “monstro” que pintas mas sim apenas o teu próprio reflexo.
- Eu sei… desculpa.
- A tua nudez tornou-se num dos segredos mais bem guardados do mundo Matthew, e isso pode não ser saudável.
- É fantástico falar contigo sabias?
- O problema é que com "o segredo" libertaste o perfume a mistério. E com ele vem o desejo. E com o desejo vem a gula, a destruição. A esta altura da tua vida ja deves ter provocado a vontade de muita gente em ver-te cair. E terás perfeita consciência que foste tu que alimentaste esse “animal”. Continuas a alimentar os animais famintos em teu redor. Porque preferes a ilusão de que perto os conseguirás controlar e assim evitar que te engulam.
- Mas depois tudo tem um ciclo. Se não te anseiam não tens segredo e sem segredo desmanchas-te.
Comom brincar ao ensaio sobre a cegueira…
- Poupa-me! O teu ensaio, a tua prisão, é mais bem erótico/decadente que isso.
- Certamente… e isso coloca-me em risco.
- Tu és um filho da pureza mas o teu sangue só se bombeia com o espesso óleo da libertinagem e lascívia inteligente. É essa dualidade que te conduz à loucura... entre o “Quero” e o “Não Posso.”
- Amo-te.
- Não verbalizes obras para as quais não tens força de levar até ao fim meu caro.
- Odeio-te… às vezes assustas-me. És provocador e ao mesmo tempo completamente mórbido num carrousel qualquer onde a vertigem é cuspida dos teus lábios e se torna certeira…
- Nos mais guardados segredos, não é?


O silêncio regressara e agora para ficar. A cara de Matthew estava gélida e imóvel, sabia que naquele momento o verbo seria a última jogada e a mais arriscada de todas, mas ainda pergunta:

- Como és capaz?
- Não é uma questão de ser, é uma questão de poder…
- Ora não fosses tu o…
- Nem te atrevas!


Abandono o hotel deixado-o preso pelo olhar sobre o ombro. A vida tinha-me brindado em orgasmo naquelas horas, era o feitiço daquela que partira. Até aquele segundo fizera-se notar presente mesmo já algures num caminho de perdição rumo à cidade que, aos três, nos incendiou. Deixou assim a descoberto a verdade, deixou assim vulnerável tão secreta nudez.

segunda-feira, dezembro 01, 2008

La Vie en Rouge


O carro parou mesmo à porta como pedi para não acontecer.
A extravagância de todo o código protocolar rebentavam em discordância com o meu estado de espírito. Olhei para o Manuel e com um olhar cansado acho que lhe disse:

- Eu tinha pedido para não parar à porta. Para a próxima venho de taxi.
- Ora menino, o que tem que ser tem muita força. Está como costuma dizer aos seus amigos “Fabulous” - que entre risos confessa - Demorei algum tempo a decorar confesso. Vá lá… está tudo à sua espera como de costume e não lhe custa nada fazer a vontade por inteiro.

Surpreendido com o sentido de humor que até hoje me surpreende, não evitei desmontar-me ali todo. Afinal de contas aquele homem já assistiu a tanta coisa que talvez ele seja dos poucos que realmente me conhece.
- Tu tens uma lata Manuel. Se a Sr.ª minha mãe te ouvisse agora iria já achar que até a ti te converti. Mas talvez tenhas razão… só estou cansado e não me custará assim tanto mais uma noite de supostas “iluminações e vaidades”.
- Ela está de partida e faz mesmo questão que esteja aqui hoje. No fundo acho que ainda vos irei ver juntos um dia. Quem sabe casados.
- Manuel, menos. Sabes bem que ninguém acredita menos no casamento que eu.
- Vá… vá lá que já conta com a sua elegante hora e meia de atraso.


Abriu a porta e saí com todo o gesto daquele rectângulo de silêncio confortável.
Irrompo pelo corredor do jardim que reflectia no chão toda a minha vaidade. Subo os degraus e sorrio para o camareiro que me rebenta de simpatia por finalmente me ver.
Aquele também se algum dia abrisse a boca haveria de revelar muitos segredos de tantos que já lhe passaram pelo braço.
As portas de vidro abrem-se e ao primeiro rasgão senti logo a imensa combustão de perfumes e os sons clássicos que ela tanto fazia questão de ter presentes em todos os inícios de festa.

Entre a multidão de vestidos longos e smokings alugados os meus olhos não conseguiam evitar as jóias (umas falsas outras verdadeiras) das tantas personagem que aquele mulher consegue reunir a seu prazer.
Sempre tive a sensação que muitas daquelas pessoas se vestiam e se adornavam especificamente para ela. Afinal de contas, para tantas, um convite de Isabelle é quase que uma nomeação para a casa real de um condado onírico qualquer.

A bandeja dirige-se a mim, aceito uma bebida. Agarro no copo e sinto uma textura diferente. Olho para as minhas mãos e percebo o detalhe sublime. Só ela mesmo para se lembrar de uma coisa destas. Cada copo tinha preso, no pé, uma fita de cetim encarnada. Nas duas pontas da fita estavam presas duas medalhas (cada uma em sua ponta) de metal com as seguinte frase: “La Vie en Rouge”.
Ela sempre foi a mais lunática, a mais louca, a mais minuciosa mas isto eu achei extraordinário.

Procuro-a de imediato naquele imenso hotel. É ela que me encontra e, pelas costas, abraça-me.

- Estás à procura de alguém?
- De ti meu amor… tu és incrível.
- Gostas?
- Estás linda, como sempre. Eu sabia que haverias de estar de vestido “Rouge”. Percebi isso nas medalhas.
- Vesti para ti e terás sido dos poucos que reparou nesse detalhe.
- Não sejas assim, toda a gente terá reparado. Aliás, é por isso que o fizeste.
- Achas mesmo?…sabes bem que o fiz para nós.
Repara…
(e rodopiou sobre si mesma com os braço ao alto recordando os seus tempos de bailarina quando o seu público a aplaudia de pé)
Não resisti e comprei-o para mim. Liguei ao Manuel e ele revelou-me o que tinhas preparado vestir.
- O Manuel, aquele traidor… e a cena do carro também foste tu que o convenceste a fazer?
- Claro meu querido, onde já se viu Sua Alteza entrar de de forma discreta…
- Só tu. Nunca vais mudar pois não?
- Nunca…


E desliza a mão sobre o meu braço, aproximando os lábios dos meus, provocando o orgasmo da imensa dança entre o seu perfume e a minha pele.
Agarra-me na mão e puxa-me conduzindo-me pela festa enquanto, no disfarce da simpatia em que a todos sorríamos, íamos falando.

- Tenho umas pessoas para te apresentar.
- Ok, mas conta-me, como estás?
- Estou pronta.
- Pronta?
- Sim, pronta para não mais voltar sem ser somente assim… de passagem, de festa.
- Eu percebo…

Somos interrompidos por um burguês qualquer que na encenação do seu gesto quase fez-nos prever que, até nós, já teria adormecido muita gente em escassos minutos de conversa.
O burguês, um jovem artista plástico que também escrevia poesia (tão pouco surpreendente) entre o exagero da adoração por ela deixava escapar o ar nervoso de um desejo voraz pelo meu pescoço. Era infinitamente delicioso no seu constrangimento e exagerado esforço em manter a pose.

Isabelle, como uma verdadeira diva, mantinha a pose provocadora versus professora de ballet entre o gesto da ponta dos seus dedos e as delicadas e flagrantes expressões do seu olhar. Nunca me largara o braço durante toda aquela agonia de conversa da treta e fez deixar claro que nem tão pouco o ia fazer quando me tentei soltar no final do primeiro minuto.
Enquanto levo o copo à boca desvio o olhar cruzando-o com o dela. Ela estava a ter um prazer mórbido com toda aquela encenação. Ela gritava em silêncio numa gargalhada infantil por dó daquela criatura. Não o deixava invisível com o torcer constante do tornozelo. Mas era óbvio que o infeliz nem o notou.

Finalmente o burguês livrou-nos da agonia quando Isabelle, já rendida, o decide apresentar a uma vereadora qualquer. Uma carcaça que já estava tão habituada a entrar em cena quando preciso que tinha certamente já bebido demais para o aguentar.

Avança rapidamente em fuga arrastando-me para o jardim como se por dentro tentássemos mais um record de corrida no Luvre.

- Que tédio de personagem Isabelle, era aquilo que me queria apresentar.
- Não querido, mas agora também já não interessa… Ai foi tão divertido. Reparaste como ele estava nervoso?
- Reparei…parecia uma criança. Achas que ele desconfia de nós?
- Acho que ele terá a certeza e estava com medo que nós o percebesse-mos. Ridículo. E o desejo? Ai…e o desejo…
- Pára…
- Lá está cherrie, lá está… como é que a vida seria Rose se pode ser Rouge?
- Já tenho saudades tuas.
- Eu sei, mas é bom que o sintas porque tenciono esperar-te lá.
- Tu estás pior meu amor… sabes bem o que a aquela cidade faria de nós.
- Aquela cidade à muito que nos espera.

O silêncio apoderou-se daquele lugar. A festa decorreu como esperada e mais uma vez assinalou o adjectivo de inesquecível para tantos daqueles corpos.
O meu carro chegou e eu decidi ficar.

Na manhã seguinte acordo e a cama estava vazia. Pelo frio dos lençóis ela já tinha partido à algumas horas. Na mesa, um bilhete simples:
“A morte fica-nos tão bem. Isabelle”

Inundo-me no banho e sinto o empregado a entrar. Quando regresso, junto ao pequeno almoço tinha uma mala que fabulosamente o Manuel (o tão extraordinário Manuel) deixara na recepção com duas mudas de roupa e um frasco de perfume.
Dei comigo a pensar que, se a minha vida dependesse de algumas pessoas, eu seria perfeito com toda a certeza.
Arranjo-me e já junto à porta ainda vislumbro o travo do seu perfume. Ela desenhara tudo na perfeição e como uma grande miragem até no abandono se tornava perfeita.

Passo pela recepção e peço para me chamarem um taxi. Ainda era muito cedo para eu ouvir o Manuel.
Do lóbi de entrada reconheço uma silhueta lá fora. Aproximo-me e não queria acreditar.
Era ele, Matthew. A olhar para mim, nas escadas do Hotel, com toda a certeza de quem me esperava por aquele momento.




06 - Casta Diva!.mp3 -