Existem dias em que o frio nos intrenha a pela e o sol apenas nos recorda, com o luto do seu calor, que à noite o gelo cobrirá a nossa cama.
Foi num dia desses que Matthew se sentou sozinho, na baixa da cidade, e contemplou o silêncio daquelas tantas vozes que não lhe pertenciam como antes.
A fadiga de uma vida veloz e intensa tinham-no levado ao limite. O corpo, rasgado, há muito que anunciava a sua segunda morte.
Tinha acordado do tratamento que odiava mas do qual já não podia fugir, e sentiu-se quente.
Só, mas quente. Talvez fosse a fantasia daquele inverno que lhe coloria o rosto, ou a recordação da fábula de outono à qual chamou felicidade tantas vezes.
Existia alguma coisa estranha naquele ar. Não era o frio intenso nem o calor dos poucos raios que atravessavam o azul. Não eram as últimas danças nos salões nobres, nem muito menos o cheiro da luxúria que cada vez menos o acompanhava.
Eram um cheiro a cinzas com tinta escorrida e espessa… era o cheiro a cinza sobre uma estranha folhagem de outono que cobria o chão. Eram os tons quentes sobre aquela manto gélido de emoções em estado líquido.
Era o abandono de corpo e sangue por ausência de vigor. Era o cansaço completo como uma bolha de ar demasiado denso para se conseguir inspirar. Era o desejo de mudança e a força de uma vida. Eram as talhas de um machado a seco sobre tanta vida submersa.
Era a segunda morte, de facto, anunciada.
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