quinta-feira, dezembro 04, 2008

La vie en ROUGE II

Era ele, Matthew. A olhar para mim, nas escadas do Hotel, com toda a certeza de quem me esperava por aquele momento.
photo by Ed Freeman

Desço os degraus pisando o chão de uma forma firme depois do compasso em que respirei fundo ao topo.
Aproximo-mo dele e pergunto:

- Estavas à minha espera caro Matthew?
- Não sejas hipócrita, sabes bem que não estaria em frente ao Lapa Palace se não estivesse à tua espera… ou à dela.
- Se estavas à espera dos dois já vens tarde, ela partiu cedo. Talvez devesses ter vindo à festa, não?… ah, que disparate, já me esquecia que nunca terias tomates pra vir, não é?
- Estúpido, eu não vim porque não quis.
- Ai sim?Então o que estás a fazer aqui agora?… Contavas encontra-la e não esperavas ver-me a mim, confessa.
Tu acreditas no amor eterno, não sejas cobarde e assume-o
- Eu sou um romântico. Acredito em amar tudo e todos, e como sou parvo, apaixono-me por tudo. Conclusão: a paixao lixa-me o amor.
- Ahhhhh meu caro gémeo sonhador.... que saudades. Concordo e também acho que exista.
Tu já o tens nas mãos mas andas com ele sem nunca o largar por inteiro.
Seremos sempre isto, mas tu serás sempre a esperança.
O do corpo incorrumpível que só deixa que lhe contaminem os lábios e a pele, mas o sangue, esse será sempre só o teu, o puro, o genuino, o que ainda acredita!
Isso é extraordinário, invejável até .
- Olha lá, tu tens noção que acabaste de me despir como nunca ninguém o fez?
Sinto-me completamente nu. Odeio-te. Cabrão.
- Tu tens noção que sempre estivemos a nu um com o outro, não tens?
- Juro-te, sinto-me pela priemira vez a descoberto. Que horrorrrrrrr…Acho que nunca me despiram tao rápido. Como és capaz? Odeio-te…
- É… a velocidade é um dos meus fortes, ou um dos meus males, nunca cheguei a perceber.
- Como se fosses contaminado na concha percebes? Uma ostra num mar sujo vive suja, mas há sempre uma esperança lá dentro. Ai… está a fazer-me confusão falar de mim. É demasiado pessoal e não o falo com ninguém. Nunca o fiz e isto baralha-me.


O silêncio apodera-se do momento e Matthew, nervoso, afasta-se até ao jardim. Parecia completamente perdido. Aproximo-me dele e ergo o meu braço sobre os seus ombros.

- É mais fácil calarmo-nos do que falarmos de nós mesmos, não é? Mas não temas... doi mas liberta.
- Ás vezes prefiro surpreender-me com as minhas acções do que pensar porque as fiz.
- Ás vezes preferes agir sem pensar na ilusão de isso te ilibar da responsabilidade dos teus actos, isso sim. Preferes não dar tempo à tua consciência na esperança de que a grande máquina por ti arquitectada apague rapidamente o peso do resultado dos teus próprios pensamentos. Era isto que querias quando me convidaste ontem a ficar à conversa à lareira... a certeza que não elouqueceste quando chegaste a estas conclusões sozinho e a sós. A confirmação de alguém que não tem nada a perder e por isso te verbaliza, em corpo presente, o que vês gritar de dentro de ti.
- Se eu soubesse que iamos ter esta conversa à lareira nunca te convidaria.
- Convidarias sim... Quanto mais não fosse pela vaidade de correr esse mesmo risco e da quase tesão mórbida de testar o limite da tua pele.

Afasta-se e de costas reage…

- Cala-te
- Calma meu amigo, eu não seria o “monstro” que pintas mas sim apenas o teu próprio reflexo.
- Eu sei… desculpa.
- A tua nudez tornou-se num dos segredos mais bem guardados do mundo Matthew, e isso pode não ser saudável.
- É fantástico falar contigo sabias?
- O problema é que com "o segredo" libertaste o perfume a mistério. E com ele vem o desejo. E com o desejo vem a gula, a destruição. A esta altura da tua vida ja deves ter provocado a vontade de muita gente em ver-te cair. E terás perfeita consciência que foste tu que alimentaste esse “animal”. Continuas a alimentar os animais famintos em teu redor. Porque preferes a ilusão de que perto os conseguirás controlar e assim evitar que te engulam.
- Mas depois tudo tem um ciclo. Se não te anseiam não tens segredo e sem segredo desmanchas-te.
Comom brincar ao ensaio sobre a cegueira…
- Poupa-me! O teu ensaio, a tua prisão, é mais bem erótico/decadente que isso.
- Certamente… e isso coloca-me em risco.
- Tu és um filho da pureza mas o teu sangue só se bombeia com o espesso óleo da libertinagem e lascívia inteligente. É essa dualidade que te conduz à loucura... entre o “Quero” e o “Não Posso.”
- Amo-te.
- Não verbalizes obras para as quais não tens força de levar até ao fim meu caro.
- Odeio-te… às vezes assustas-me. És provocador e ao mesmo tempo completamente mórbido num carrousel qualquer onde a vertigem é cuspida dos teus lábios e se torna certeira…
- Nos mais guardados segredos, não é?


O silêncio regressara e agora para ficar. A cara de Matthew estava gélida e imóvel, sabia que naquele momento o verbo seria a última jogada e a mais arriscada de todas, mas ainda pergunta:

- Como és capaz?
- Não é uma questão de ser, é uma questão de poder…
- Ora não fosses tu o…
- Nem te atrevas!


Abandono o hotel deixado-o preso pelo olhar sobre o ombro. A vida tinha-me brindado em orgasmo naquelas horas, era o feitiço daquela que partira. Até aquele segundo fizera-se notar presente mesmo já algures num caminho de perdição rumo à cidade que, aos três, nos incendiou. Deixou assim a descoberto a verdade, deixou assim vulnerável tão secreta nudez.

1 comentário:

AnaT disse...

"Não ponho nem tiro nada daquilo que tu és. Amo-te como se pudesse medir o meu amor por mim mesma, com tudo...o que isso implica..."
Estou longe, mas não estou morta. Nesse hotel paira o veneno...veneno do meu veneno.Porque quero, porque posso. E porque sou assim.
Mais uma vez, repito: "ninguém me pode roubar de ti quando eu já sou o teu próprio corpo, o teu perfume encastrado na pele, as palavras na tua boca, a tua memória de fogo..."Isabelle*