segunda-feira, outubro 19, 2009

A carne I


A forma... o cheiro, a pele.... a carne.
Tudo ao mesmo tempo numa tempestade de raiva cujos os reflexos insurgiam apenas a dor.
O silêncio.
O som ensurdecedor da máscara de ferro contra o chão.

O sabor... o sabor do sabonete e o travo de citrino que interrompe o cigarro.

- Porque fumas agora?
- Porque me apetece.
- Não devias.

- Porque fumas desde sempre?
- Ok.


O cheiro, a pele, a forma... a carne.
As tuas pernas frias contra o teu peito num compasso de ansiedade.
A agitação, os corpos.

Eram 3 da manhã e os lençóis denunciavam a turbulência do sono suspenso sobre o fio da navalha com que te auto-flagelas.
Fui dar contigo a esquecer-nos... fui dar contigo a perceber o que tinha acontecido e a fechar os olhos com toda a força, para mais uma vez conseguires adiar o inevitável.

O cheiro, a forma, a pele... a carne.
A pele que cobre o peito onde os rios de sangue bombeiam um fascínio absurdo pelo homicídio onde a estética da morte te adormece os sentidos.

Os teus quase lábios sobre os nossos quase beijos. As mãos entrelaçadas como se, por terem nascidos cegas, surdas e mudas, fossem as únicas testemunhas de um crime que se poderiam manifestar sem ninguém a afastar.
A força, o sexo.
A máscara abrupta que se desfaz em mil pedaços e revela a nudez mais bela do crepúsculo contra o meu peito.

A estupidez de uma frase contida entre os dentes, o imutável prazer de que nos privamos.
Já não és o animal ferido com as feridas a céu aberto.

Odeias-me porque nos odeias na possibilidade de conforto de comigo adormecer encaixado, sem culpa, sem máscaras, sem roupa, sem sono, mas com o gesto, o sentimento... o nome que tanto lutas para tirar de mim.

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