sábado, agosto 23, 2008

Le Petit Trianon

Chovia em silêncio , naquela Primavera senil, quando se despediu pela primeira vez de si mesmo naquela história.

No banco do jardim repetia a imagem e as palavras daquela personagem que partira do palácio.
Estava doente, e o seu corpo denunciava a cada gesto o desiquilíbrio de uma vida demasiado intensa até ali.

Anoiteceu e ali continuava. Com o seu vinho, o seu cigarro, o seu livro e as suas infinitas recordações de detalhe e beleza em tudo o que viveu.
Arrefeceu e com um simples gesto percebe o fim. O manto de veludo negro, que terminava seguro num remate barroco de fio de ouro, estava de regresso sobre si de uma forma tão natural que nem se deu conta. Estava frio e não conseguia deixar de rever os fragmentos da repetição da vida ali. Exactamente ali. Onde um dia, também já para lá daqueles muros, entre as seteiras, se despediu a primeira vez daquele corpo.
Regressara ao luto e na mão guardava o telegrama vindo do outro lado do Oceano, escrito por um amigo hoje mais sereno que lhe perguntava: "Chegou mesmo ao fim, não chegou?Esta na hora de virar as últimas páginas do livro. Percebo que sintas chegada a hora. Parte. "

O silêncio é enterrompido por uma voz:
- A LadyLime chegou. Está pronto para sair? Está tudo pronto para jantare na cidade com a máxima tranquilidade...
- Peça-lhe para aguardar um pouco no salão. Afinal de contas perdi-me nas horas e não será assim que quero recebe-la.

Já não via aquela amiga de longa data à muito tempo. Jantaria com ela e recordaria a saudade que lhe tinha abandonando o palácio e celebrando algures pela cidade.

Amanheceu e a primeira coisa que se perguntara era se iria conseguir passar outro tanto tempo sem ela. Passaram tanto e tão bom tempo juntos que até aquele dia não percebia como a vida os tinha feito não mais viver no mesmo condado. Ficava a esperança do seu regresso e o sorriso que sempre deixa marcado por onde passa. Seria uma irmandade para a toda a vida e isso por si só já lhe dava a certeza do “para sempre” que em poucos lugares encontrou na sua viagem.

Abre as janelas e ao pequeno almoço decide partir.
Recordava o mundo como ele era e abraçou-se em despedida com a saudade do que ele foi.
Fez as malas e partiu.
Em silêncio, ao entardecer, rumo ao exílio de si mesmo, rumo a Petit Trianon.


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