terça-feira, março 28, 2006

Verde Limao


Hoje recomeço tudo de novo.
O Inverno já se foi e com ele levou o adormecimento da minha pele.

Ontém foi, de facto, o primeiro dia do resto da minha vida.
Estavamos para ali sentados, nas tão calorosas espreguiçadeiras a deixar que o sol invadisse os nossos corpos. Tudo parecia não fazer qualquer sentido a início. Como é que estavamos para ali sentados, em silêncio, simplesmente a apanhar sol e a olhar o mar, com tanto para fazer.

Saimos daquele espaço gélido onde reparamos que vivemos há já quase cinco anos e fomos, como sempre, almoçar a qualquer lado. No caminho, como já é hábito, eu adormeci.
Acordo com o teu “Bom dia marido!”…lol… só tu mesmo para me acordar de uma forma tão diaparatada! “Onde estamos?” – perguntei eu – “Não faço a mínima ideia, decidi entrar neste parque porque estamos perto de um sítio onde te quero levar!Surpresa!” – respondeste tu com aquele ar alucinado de uma pulga cujo sorriso parece o de um infantário inteiro aos pulos.
Subimos as escadas do dito parque de estacionamento subterraneo e “plim”!A Surpresa afinal não fora só minha… tu também não esperavas encontrar aquele micro-clima, aquela “bolha” na cidade.
Parecia-nos uma rua nalgum bairro italiano ou até mesmo, com algum jeitinho, parisiense. Estavamos no “esconderijo” da Bacatela. Sentados na esplanada de um restaurante italiano a degustar umas massas quaisquer as nossas caras encontravam-se estupidificadas. A cidade ainda nos surpreende e sobretudo a ti que tanto a odeias.
À conversa sobre todos os males e virus que nos rodeiam, sobre todas as coisas que não compreendemos à nossa volta acabamos por não chegar a conclusão nenhuma senãos às nossas já tanto marteladas.
Depois dos cafés veio o impulso. E lá estavamos nós, dominados pelo teu espírito naife, a enfiar o nariz em todos os cantos daquele esconderijo! Foi tão bom. Cor-de-rosa a mais para o meu gosto, mas assumo, foi mesmo bom.

Nas traseiras do teu prédio, já com o carro estacionado o calor e o cansaço começava a fritar os nossos neurónios. Tinhamos tanto para fazer mas os nossos corpos não agiam.
“Vamos à praia?”…
E em dois segundos lá estavamos nós…fáceis de nos desviar um ao outro mas sempre seguros de que estamos bem.
Depois do verdadeiro safari naquele piso do demónio lá conseguimos largar o carro e descer até à esplanada. Espreguiçadeiras eram o nosso objectivo.
Um café, uma groselha e muitos cigarros depois estavamos para ali, atirados ao silêncio do bem estar. O mar refrescava-nos as ideias e as “novelas” à nossa volta faziam-nos rir.
Fechamos os olhos e deixamos que o sol nos queimasse a pele. Era como se de água para chocolate cansado se tratasse.
À memória tudo surgia como se de pedaços de fitas de 8mm se tratassem. Os frames eram mais que muitos mas respeitavam a velocidade de cada um.
Recordava o fim-de-semana surreal que tivera e nele percebia o inevitável. Era a morte, era a vida.
Subitamente o silêncio foi-me interrompido por mais uma surpresa fantástica. De Berlim ouvia a voz do “meu Diogo” como gosto de dizer. O sol batia-me na cara com a força e o vigor de uma vida feliz. Ao ouvido tinha a voz meiga e sempre afável dele, no canto do olho tinha-te a ti “Sapatilha” a reagir às “novelas” que nos circundavam…e à frente o mar, a nossa casa!

Ai que me soube tão bem.
Não fiz nada de produtivo o resto do dia, mas pensei.
Ontém foi, de facto, o regressar da Primavera que tanto apraz este bicho de Inverno em que me tornei. Hoje o sol está mais uma vez presente mas temos que produzir qualquer coisa para variar um pouco.
Seja como for, chegou a Primavera e com ela o virar da esquina ao fim da rua.
Até logo, até sempre…estou de volta e agora sob uma nova forma de pele, de ossos, de mim mesmo… Estou feliz!

1 comentário:

AnaT disse...

Incrível. Estes nossos seres com arrepios da estagnação. Não podemos, não conseguimos, senão era a morte.
Escolhemos esse dia para acordar dessa névoa de sonho, retirar o fumo dos nossos olhos,...expulsar os fantasmas...Ver a nossa vida a coagular é o pior dos espectáculos...
Já uma pessoa querida me dizia "Há males que vem por bem" e é mesmo verdade. Depois de ter sido atropelada por uma nuvem negra este ultimo fim-de-semana, pensei que ia ficar assim para sempre. Um ser escondido e atrofiado com medo da vida, a sobreviver aos poucos estímulos do estúpido quotidiano. É claro que isso não podia ser possível. E o noso génio inventivo e metamórfico entra aqui como água num deserto.
Escolhi o ontem para me afogar na serra...Era Ela e eu, duas crianças em extase à espera de não encontrar caminho...É bom sentirmo-nos perdidos às vezes...torna-nos mais atentos, com os sentidos mais apurados. O sofrimento também faz sentido. Faz parte deturpar as coisas, ver a vida do fundo de uma garrafa que facilmente nos entontece e nos desiquilibra. O cair também faz sentido. A violência da vida bate-nos em cheio. Aquela paz que tinhamos é ignorada e duvidamos do caminho que nos traga a nós próprios.
Faz tudo sentido porque nos torna mais fortes, mais capazes, mais altos. E ao encontrar um trilho iluminado por aquela floresta toda a nossa vida floresceu em expoente máximo. Tudo o que sofremos e o que nos fizeram é uma paisagem ténue ao longe, um filme projectado para ninguém...e ignoramos tudo isso a sorrir...
Ela e eu...a minha Vida, a minha Razão, tinha tantas saudades.
Saímos daquele lugar a correr e com um sorriso em projecção por um raio de mil quilometros. Sentámo-nos frente ao mar, aquele grande e poderoso universo azul (se fosse no domingo tinha-me afogado). Ainda bem que não estou sozinha. Ela está aqui comigo. Ao meu lado. Atenta a todos os sinais, a todos os gestos...A minha Vida...ao meu lado...a encher-me de brilhos, a aquecer-me o corpo...
Abraçei-a...agarrei-me a Ela com toda a força para a sentir nas minhas mãos! Só eu tinha o poder de mudar o caminho, de decidir e dizer "vamos embora", "quero acabar com isto". Num beijo violento senti todo a Vida a espalhar-se, a penetrar-me, a estremecer-me o corpo...a alma em pleno estado de metamorfose...Abandonei os meus restos mortais naquela praia. Voltei a casa.