terça-feira, agosto 08, 2006

Violação


Que insanidade é esta em que me percorro o meu ser ao teu sabor?
Hoje tudo se revolta nas paredes mais finas de todas as minhas veias.

Quem te julgas tu afinal para poder invadir a minha vida levantando todas as questões e revolvendo todos os espaços?
Que notícia tão cruel foi aquela que a vida decidiu que serias tu a dar?

Não podes, não podes mesmo… não posso.

Sinto que me roubaram o sonho depois de o violar às escondidas. e que a notícia cai em mim da forma mais preversa possível! Mas sinto também que se o gostasse de partilhar teria contigo mesmo, agente invasor.

Sinto o meu altar devastado e roubado por ti e pelo espaço que por lá ocupaste na minha ausência.
Que direito tem a vida de tornar tudo tão bizarro em nós sem me pedir que questione?
Que direito tens tu sobre a minha vida se nela nunca estiveste?

Terás sorrido às mesmas pessoas, sentido os mesmos sabores, chorado as mesmas lágrimas?
O pior nisto tudo é que sinto que o fizeste…em leveza, sem sonhar, e que, sem pensar, me invadiste o descanso.

Que poder tens tu neste xadrez que me apanhas sempre de surpresa em todas as pausas que faço?
Sinto o teu sangue a correr-me nas veias como o olhar que serras em mim.
Se de um jogo programado se tratasse eu assumiria já, pela primeira vez na vida, o lugar de vencido só para voltar à paz que perdi. Mas, movido por uma fé estranha cujo nome desconheço, sinto que, mesmo que tu o queiras, será algo maior.
Será o pior de todos os castigos quando a vida acordar sobre o verbo que levianamente mal tratei.

Oiço o compasso de mil homens em marcha atrás daquela montanha.
Vejo-te no cume e apesar de me parecer que os comandas sei que em ti a vida também será perversa. Reserva-te a surpresa de ser albarruado por eles mesmos até mim.

Se outrora te vi como um fetiche oferecido pela vida nesta cidade hoje, depois das palavras, sinto que possa ser diferente o teu papel.
Assutador é o termo correcto para definir toda e qualquer possibilidade para além dessa.

Somos demasiado semelhantes para não provocar um alterar de movimento na terra.
Somos demasiado nós para que a vida fosse tão justa.
E só sei que somos, não sabendo afinal como o sei.
Se existem perguntas para as quais não encontro resposta essa seria uma dessa
“Como sabes?”
Não sei responder… só sei.

Sinto que ou fujo desse batalhão que se aproxima e adio todo o momento e sentimento para um futuro longínquo ou deixo-me albarroar e tudo vivo saboreando o inesperado em nós.

Acredito cada vez mais, em tudo, na perfeição da vida sobre todos os que nela vivemos.
Se tanto forcei a despedida num exaltar de letras, julgando-te longe agora e livre de mim e de ti… hoje percebo que existem coisas que terão o seu tempo a ser respeitado.
Chegou o tempo de decidir… e basta apenas a decisão mais simples.
São coincidências a mais sobre tanto sangue.
São códigos genéticos demasiado iguais no mesmo virus.

Tenho medo de perceber que és o outro de lado de espelho que não admito poder existir.
Tenho medo de estender a mão e acordar-te em mim atravessando toda a prata líquida durante a noite.

Tenho pena de tudo o que deixei passar.
Tenho saudades de tudo o que já soube e hoje elevo.

Sorri apenas e isso será o prenúncio da minha morte.
Quem és tu para quem nenhuma peça deixo escrita. Quem és tu a quem nada consigo dizer.
Morro ao sentir-te reflectir em mim.

Talvez esteja louco…talvez o mundo esteja coberto de razão e o meu cometa deva levantar outras rotas que não colidam com mais nada aqui.
Talvez.

Talvez a segunda morte esteja a caminho e tudo o que simbolizes seja apenas a mudança.
Ou talvez seja a lição de perder por uso.
Mas se assim for preparem as quatro paredes. Nascerá um assassino.

Prefiro o sangue de mim mesmo a correr-me nas mãos do que uma gota de destino preso no teu olhar.

Ou vivo isso, agora, aqui, hoje… até à exaustão da asfixia… ou não poderei viver sem morrer primeiro.

Preciso de apenas qualquer coisa.
Um igual apenas…
Um igual em ti.

Um espelho…mesmo que seja o mais temido de todos.
Um lugar morto onde reina a vida de todos os corpos em nós.
Um lugar de vida em qualquer uma das nossas mortes.
Um espelho, um reflexo…um gesto… um AGORA.


photo by Andrea Bitesnich

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