terça-feira, abril 18, 2006
Pérolas a Porcos II
— Ainda bem que te encontro…
— Porquê?Já não se pode fumar um cigarro em paz, num sítio em que ninguém me oiça?
— Estão corpos nus no sala! O que é que eu faço?
— Come-os.
— Claro…era de calcular essa tua resposta. Só não percebo porque é que estás aqui, e não estás na sala também, como um bom anfitrião que sempre foste nestas coisas.
— Vai à merda!
— …o que é que se passa contigo?…estás diferente, nem pareces tu. Onde é que está aquele sangue a fervelhar por carnes vivas e corpos racionais?
— Eu mudei, eu disse-te.
— …mudaste ou estás de barriga cheia?
— Não sejas estúpida… o único corpo que ali me interessa já estará contaminado, pela saliva dos outros que a mim nada me dizem.
— …estranho…muito estranho… Durante anos esperei ouvir isso, na ilusão de existir algum tipo de moralidade nesse teu corpo de consumo, e hoje, logo hoje, decidiste ser diferente. Não há quem te entenda…
— Não há quem me coma duas vezes da mesma forma, diz antes assim.
— Estúpido, como é que te atreves?
— Bem…vou-me vestir, chamas-me um taxi?
— Porquê? Onde vais?
— Tenho “deveres sociais” minha cara…tenho uma inauguração, que já conta com a minha habitual hora de atraso. Mas deixo-te a chave dsta casa e peço-te um favor. Livra-te daqueles corpos na sala e cuida de manter o ambiente limpo…não quero manchas de lascívia em lado nenhum por favor.
— Não te preocupes, sou especialista em limpar a merda que fazes, ou já te esqueceste?
— Também gosto muito de ti… até logo.
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3 comentários:
"Começo a conhecer-me. Não existo.
Sou o intervalo entre o que desejo ser e os outros me fizeram,
ou metade desse intervalo, porque também há vida ...
Sou isso, enfim ...
Apague a luz, feche a porta e deixe de ter barulhos de chinelos no corredor.
Fique eu no quarto só com o grande sossego de mim mesmo.
É um universo barato. "
Fernando Pessoa
Estou chocado... e não é por achar que ninguém chama um táxi daquela maneira :p
Entrei, sentei-me.
Consumí o que havia à mão.
Levantei-me e já à porta para sair, resolvi deixar um bilhete que dizia:
"Hei-de voltar!"
Não gosto de me sentir anónima quando gosto daquilo que consumo.
beijo*
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